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terça-feira, 21 de julho de 2009

SERRA DA CANTAREIRA

Impressionante saber que em plena cidade de São Paulo ainda existem animais vivendo em seu habitat natural, mesmo que ameaçados por pressões absurdas do crescimento da população humana, do desmatamento e poluição de todo gênero e grau.
Muitos deles estão ameaçados de extinção e fica a pergunta: Até quando eles aguentarão viver em fragmentos florestais cada vez menores e sem conexão com outras áreas protegidas para a garantia da troca genética?


Vale todos os esforços para conhecer e preservar a Serra da (En)Cantareira!


O bugio (Alouatta clamitans) é um primata encontrado na serra da Cantareira - Carlos Zacchi/Instituto Florestal

Moradores da Serra da Cantareira convivem com bichos de várias espécies

LAURA GUIMARÃES
Colaboração ao UOL Bichos


Apesar de ser um dos milhões de habitantes da Grande São Paulo - muitas vezes lembrada pelos prédios, carros e poluição - Joacir Salles de Barros vive cercado pela natureza e costuma receber no quintal de sua casa, na Serra da Cantareira, um grupo de bugios.

Os macacos da espécie aparecem quase diariamente para se alimentar dos frutos e folhas das árvores. A mãe costuma carregar o filhote pequeno nas costas. O mais ousado deles, segundo Marina Braga Médici - frequentadora da região e namorada de Barros -, parece nem se intimidar com os latidos dos cães domésticos.

Além dos bugios, vários bichos são vistos na Serra da Cantareira, região que se estende pelos municípios de São Paulo, Guarulhos, Mairiporã, Caieiras e Franco da Rocha. A floresta, maior em área urbana do mundo, é habitat de mais de 380 espécies entre répteis, aves, mamíferos e anfíbios.

"Na Serra da Cantareira podem ser encontradas 45% das espécies de médios e grandes mamíferos de todo o estado de São Paulo e 14% do Brasil" diz Marcio Port Carvalho, pesquisador científico do Instituto Florestal, órgão de proteção e pesquisa do governo do Estado de São Paulo.

Entre eles estão animais raros e ameaçados de extinção, como a onça parda, o gato do mato pequeno, o sagüi da serra escuro e a jaguatirica.
Há ainda nomes como araçari banana, o beija-flor de cabeça azul, o gavião pega-macaco, o gato mourisco, o pica-pau de cabeça vermelha, o macuco, a jararaca, a perereca risadinha e a coruja orelhuda.

Vizinhos do mundo animal

Como é viver tão perto dos bichos? Para muitos moradores da Serra, a convivência pacífica e prazerosa. "É incrível ficar perto destes bichos", diz Eugênio Oz. "Acordo com o barulho dos tucanos e à tarde aparecem papagaios."

Para Ana Cristina Ferreira, o incômodo não existe nem quando se trata de espécies tidas como perigosas, como no caso da aranha marrom. "Eu curto aranhas. Não as mato nunca. Se aparece uma dentro de casa, pego um pedaço de papel e tiro". Ana conta que já encontrou nos arredores de sua casa bichos-preguiças, cobras, jacus e até um veado.

Os moradores da região não são os únicos que podem ver os animais de perto. A Serra da Cantareira possui uma Unidade de Conservação de Proteção Integral, o Parque Estadual da Cantareira, com aproximadamente 8.000 hectares de Mata Atlântica divididos em quatro núcleos - Águas Claras, Pedra Grande, Engordador e Cabuçu -, abertos ao público nos finais de semana, feriados e férias escolares.

"Vale ressaltar que tanto a presença dos moradores quanto dos visitantes da Serra não deve interferir nos hábitos dos animais", alerta Marcio Port Carvalho, "Por exemplo, oferecer alimentos não é uma boa ideia. Espécies que naturalmente são dispersoras de sementes de árvores nativas podem deixar de cumprir seu papel no ambiente, há o risco de acidentes como mordeduras e transmissão de doenças e zoonoses, e eventuais mudanças do seu comportamento natural".

Atualmente a Serra da Cantareira vem sofrendo diversos impactos e ameaças. Os principais deles, que saltam à vista de quem passa pela região, são as ocupações irregulares e desmatamentos. Para construir uma casa na Serra é necessário seguir a legislação vigente. Os pedidos de processo de licenciamento ambiental devem ser feitos no Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais (DPRN).


A Serra da cantareira abriga exemplares de felinos - como esses Jaguarundis, ou Gato-Mourisco (Felis yagouaruundi) - Vincent Lo/ Instituto Florestal


O pica pau de cabeça vermelha (Dryocopus lineatus) vive solitário ou aos pares, arrancando a casca e bicando troncos e galhos maiores em busca de insetos - Vincent Lo/ Instituto Florestal


Gavião Pega-macaco Spizaetus tyrannus, ave de rapina adaptada para caçar em regiões de mata fechada - Vincent Lo/ Instituto Florestal


Beija-flor-de fronte violeta habita florestas altas, capoeiras e jardins - Vincent Lo/ Instituto Florestal


O gato-do-mato-pequeno, espécie de gato silvestre (Leopardus tigrinus), ameaçada de extinção, registrado com câmera trap no Parque Estadual da Cantareira - Marcio Port-Carvalho/ Instituto Florestal


Na serra, os tucanos são muito comuns e fáceis de seres vistos e ouvidos - Marcio Port-Carvalho/ Instituto Florestal


Onças-pardas ainda são encontradas na cidade de São Paulo - Marcio Port-Carvalho e Cássia Garrido/ Instituto Florestal


Morcego frugívoro importante no processo de dispersão de sementes e regeneração das florestas - Marcio Port-Carvalho/ Instituto Florestal


Ave que se locomove saltando de árvore em árvore - Vincent Lo/ Instituto Florestal



Paca é vista no escuro no Parque Estadual da Cantareira - Marcio Port-Carvalho/ Instituto Florestal


Espécie rara de tucano da Mata Atlântica encontrada na Serra da Cantareira - Marcio Port-Carvalho/ Instituto Florestal



Filhote de jaguatirica, espécie de felino ameaçada de extinção, é um dos bichos da Serra da Cantareira, região que se estende pelos municípios de São Paulo, Guarulhos, Mairiporã, Caieiras e Franco da Rocha - Cybele Araújo/ Instituto Florestal



A cor vibrante do pássaro saí-azul (Dacnis cayana ); a Serra abriga o Parque Estadual da Cantareira, com aproximadamente 8.000 hectares de Mata Atlântica - Marcio Port-Carvalho/ Instituto Florestal



quinta-feira, 2 de julho de 2009

FLORESTA VAZIA OU DESCONHECIDA?

Guaxinim (também conhecido por "mão-pelada") flagrado na RPPN Rio das Lontras.

A importância das UCs e como melhorar nosso sistema de proteção e gestão.

FLORESTA VAZIA OU DESCONHECIDA?

Por Jussara Mangini

Agência FAPESP – Um grupo de biólogos e ecólogos da Universidade Estadual Paulista (Unesp) realizou, durante quatro anos, censos de mamíferos cinegéticos (que são alvo de caça) em 12 unidades de conservação da Mata Atlântica de São Paulo.

Após o agrupamento de todos os censos, os dados foram comparados com outros levantamentos feitos em toda a extensão do bioma. A metanálise foi publicada em artigo na edição de junho da revista Biological Conservation.

O trabalho consiste na maior amostragem das populações de grandes mamíferos na Mata Atlântica e foi produzido a partir de um projeto ligado ao programa Biota-FAPESP na modalidade Auxílio a Pesquisa – Regular, conduzido pelo professor Mauro Galetti, do Laboratório de Biologia da Conservação do Departamento de Ecologia da Unesp, em Rio Claro.

Segundo Galetti, até então, a maioria dos censos na Mata Atlântica enfocava apenas fragmentos pequenos, ignorando áreas contínuas do litoral. “Boa parte dos pesquisadores acredita que as populações de grandes mamíferos estão salvas nas principais áreas protegidas do litoral. Temos em São Paulo a maior floresta contínua de Mata Atlântica, sobre a qual não se sabe quase nada”, ressaltou.

O projeto fez um diagnóstico das populações de grandes mamíferos em áreas de conservação não fragmentadas para estimar as populações de espécies pouco conhecidas como mono-carvoeiro, queixadas, cutias, esquilos e outras que são alvos de caça. “Nossa pesquisa buscou entender o que explica a variação de abundância de grandes mamíferos nesse contínuo florestal e também em toda a Mata Atlântica”, disse Galetti.

Os censos foram realizados em 12 unidades de conservação nas três maiores ilhas de São Paulo: do Cardoso, Ilhabela e Anchieta. Também foram amostradas as populações de mamíferos na Serra de Paranapiacaba – parques do Petar, Carlos Botelho, Intervales, Jacupiranga e Jureia – e Serra do Mar – parques Picinguaba, Caraguatatuba, Cunha e Santa Virgínia –, além do Jurupará, que liga as duas serras, onde há floresta contínua.

A escassez de grandes animais, como anta, queixada e macacos, pode ser explicada pela pressão de caça e tipo de floresta, apontam os pesquisadores. Em contrapartida, a abundância dos pequenos mamíferos, como cutias e saguis, aumenta em áreas com maior pressão de caça, um fenômeno chamado de “compensação de densidade”.

Para quantificar o volume de animais abatidos ilegalmente dentro dos parques, Rodrigo Nobre, aluno de mestrado de Galetti descobriu que, anualmente, cerca de 500 tucanos e de 400 inhambus são mortos na região de Picinguaba. “É um fato alarmante, já que as Unidades de Conservação deveriam ser um lugar em que a fauna se encontra protegida, mas não foi isso que encontramos”, comentou Galetti.

Abundâncias diferenciadas

“Cada região da Mata Atlântica tem uma abundância diferenciada de grandes mamíferos. Essa enorme variação reflete, em parte, a pressão de caça em cada área e a abundância de recursos-chave como o palmito juçara”, disse Galetti.

Os parques localizados na Serra de Paranapiacaba têm uma grande abundância de primatas, mas são pobres em ungulados, como queixadas e veados. Por outro lado, na Serra do Mar, próximo a Ubatuba e Caraguatatuba, várias espécies, como onça pintada e mono-carvoeiro, são muito raras ou foram extintas localmente. Porém, o queixada (porco-do-mato), que é um animal ameaçado de extinção, é muito comum no Parque Estadual de Santa Virgínia e na Ilha do Cardoso.

Em Ilhabela, que tem mais de 30 mil hectares e é toda florestada, as populações de grandes mamíferos são muito baixas. “Ilhabela possui a mastofauna mais empobrecida de São Paulo, mas tem a maior abundância de espécies de aves de grande porte, como jacutingas e macucos”, disse Galetti.

“Não sabemos a causa dessa alta abundância, isso ainda é um mistério, já que existe muita caça na ilha. Uma hipótese é a existência de áreas de acesso muito difícil para caçadores na ilha, e essas populações se concentrariam ali.”

Defaunação na diversidade de plantas

Um Projeto Temático aprovado recentemente no âmbito do Biota-FAPESP pretende avaliar qual o efeito da variação em abundâncias de grandes mamíferos na diversidade vegetal das plantas.

“Todos esses grandes mamíferos são importantes dispersores e predadores de sementes e também herbívoros, e são eles que controlam ou favorecem as populações de diversas espécies de plantas”, apontou Galetti.

Além disso, o projeto pretende estimar a abundância de algumas espécies, usando técnicas de extração de DNA fecal e de pelos. Antas, felinos e queixadas são raramente avistados pelos pesquisadores na floresta, mas deixam seus vestígios por onde andam.

“Nosso laboratório na Unesp, junto com pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos, está trabalhando intensamente na elaboração de marcadores moleculares dessas espécies. Com isso, teremos em mãos uma ferramenta importante para determinar não apenas o tamanho populacional dessas espécies, mas também sua variabilidade genética”, disse Galetti.

Mais informações sobre o Biota–FAPESP: www.biota.org.br

O artigo Priority areas for the conservation of Atlantic forest large mammals, de Mauro Galetti e outros, pode ser lido por assinantes da Biological Conservation AQUI

* Agradecimento especial pela pauta: Rosan Fernandes