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sexta-feira, 1 de agosto de 2008

PCHs na bacia do rio Cubatão

A majestosa Cachoeira da RPPN Rio das Lontras pode ser secada pelos projetos das PCHs

A data era 23 de julho de 2008, o local o Sindicato Rural da cidade de Santo Amaro da Imperatriz e o assunto dos mais importantes para a comunidade, a possibilidade de serem instaladas seis Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) na bela bacia do rio Cubatão.

A Audiência Pública foi organizado pela Assembléia Legislativa de Santa Catarina, a ALESC, proposta pela Comissão de Turismo e Meio Ambiente e mediada pelo presidente da comissão, Deputado Estadual Décio Góes (PT), porém certamente seria mais apropriado se o ritual tivesse seguido o das apresentações de Estudos e Relatórios de Impacto Ambiental (EIA/Rima), ou seja, tempos definidos para o empreendedor, consultor e para os pronunciamentos das demais partes envolvidas.
Trata-se de projetos para seis PCHs, três no rio Caldas do Norte (ou Forquilhas) na cidade de Águas Mornas e mais três no rio Cubatão do Sul, em Santo Amaro da Imperatriz.

Rafting no rio Cubatão, um grande atrativo do ecoturismo

Segundo especialistas da área, o que se viu foi uma apresentação em formato de propaganda por parte do empreendedor, que focou apenas os aspectos positivos do empreendimento. O consultor, que deveria apresentar tantos os aspectos positivos quanto - principalmente - os negativos e as eventuais mitigações e compensações, não os expôs, o que gerou uma série de questionamentos.

O proponente dos projetos é a Incorporadora Adiplan, de São Paulo.

Já pelo lado do movimento Rio Cubatão Vivo o ambientalista e proprietário da empresa
Trekking das Águas Rafting & Expedições Eleazar Garbelotto fez uma bela apresentação das atividades de ecoturismo desenvolvidas no Vale das Termas – como é conhecida a região por suas medicinais águas termais.
Keko, como Eleazar é conhecido, é membro do comitê de gerenciamento do rio Cubatão do Sul e representante da Associação Brasileira de Turismo de Aventura (ABETA) e mostrou que a
região é considerada o novo pólo para o turismo de ação do sul do Brasil e ainda reuniu números relacionados ao dinamismo econômico na região gerado pela atividade de rafting, o que deveria ter sido objeto da análise ambiental.





A apresentação parece ter sido bastante convincente aos membros da mesa, ALESC, FATMA (Fundação Estadual de Meio Ambiente) e SDS (Secretaria de Desenvolvimento Social), que vão estar em meio ao processo decisório. Inclusive o representante da FATMA, Luiz Antônio Garcia Correia em sua fala no final dos trabalhos disse claramente que após as apresentações e manifestações ele estava "convicto sobre vários aspectos" – só não esclareceu quais.

Uma das perguntas que foi dirigida ao representante da FATMA foi um esclarecimento se foram 5 ou 6 licenças emitidas, uma vez que na fala inicial ele relatou um histórico do projeto, que no começo apresentavam 7 aproveitamentos e que no momento, 5 estavam sob análise. Nas demais apresentações, do empreendedor e em uma pequena fala do consultor, foi colocado por ambos que eram 6 aproveitamentos hidroelétricos. A resposta foi que a PCH do "Schulz" (Grafia errada no empreendimento, já que a localidade chama-se “Canto dos Schuch”) estava fora. Isto ficou registrado na ata da reunião. Essa PCH tem o projeto exatamente em cima da RPPN Rio das Lontras – informação que os proponentes negam, já que afirmam ter intenção de lutar pelos 6 projetos, nem que tenham que mudar o lado do desvio do rio Caldas do Norte, praticamente secando a maior beleza cênica da RPPN Rio das Lontras.



O rio Caldas do Norte (também conhecido por Forquilhas) passa pela RPPN Rio das Lontras, onde lontras moram e inspiraram o nome da Reserva


Houve vários depoimentos - alguns mais inflamados que outros e bastante passionais - todos contra os empreendimentos. Aparentemente nem os empreendedores e nem as autoridades esperavam um posicionamento tão bem definido como o que ficou evidenciado. Entretanto, os contrários à construção das PCHs tem motivos para alguns receios e preocupações. O primeiro deles é destacar para todos os integrantes do movimento que foi apenas uma batalha vencida, mas a guerra ainda está longe de terminar.
Certamente tanto os empreendedores quanto os consultores conseguiram mapear boa parte da artilharia e a próxima batalha deverá ser muito mais dura.

Ainda como uma crítica ao movimento, houve alguns momentos de incertezas e de uma certa desorganização ou despreparo, como por exemplo, um filme que não souberam operar o computador e depois a leitura da "carta da Terra", quando se perdeu um tempo precioso, onde se poderiam objetivar mais as questões realmente importantes a cerca do empreendimento e suas conseqüências. O “bottom line” (O "triple bottom line" é o termo utilizado para refletir todo um conjunto de valores, objetivos e processos que uma companhia deveria focar com o objetivo de criar valor econômico, social e ambiental e, através desse conjunto “minimizar qualquer dano resultante de sua atuação. De acordo com esse “tripé” conceitual, reconhecemos que a sociedade depende da economia e que a economia depende do ecossistema global, cuja saúde representa o "botton line") é que para a próxima audiência deverá haver uma maior coordenação das ações, levantamentos de fatos e informações bastante consubstanciadas, haja visto que empreendedor e consultor virão com artilharia pesada.



O rio Cubatão, apesar das diversas agressões, ainda guarda grandes belezas


Outra preocupação é a falta de papel. Não existe um documento formal, oficial, destacando os "90 dias" para a preparação dos argumentos contrários ao empreendimento. Foi sugerido ao final da reunião que fosse encaminhado um ofício partindo da Câmara dos Vereadores ou do Comitê de Bacias, provocando ALESC, FATMA e SDS, sobre este assunto. O objetivo é ter uma resposta também oficial por parte de uma dessas instituições.

Parece ter ficado claro alguns recados que o representante da FATMA passou. A começar pela "análise dos aspectos técnicos e jurídicos" do empreendimento. O movimento Rio Cubatão Vivo possui pessoas que podem analisar os aspectos técnicos apresentados nos documentos, mas ainda não possui alguém da área do Direito Ambiental.



A construção das PCHs irá ocasionar a derrubada da Mata Atlântica

O outro recado foi a questão hidrológica e o conflito com a atividade do rafting. Já que não somente o dinamismo econômico e social decorrente desta atividade, mas os aspectos histórico-culturais, a coleção de paisagens naturais, e o setor turístico como um todo devem ser mais enaltecidos e melhor destacados, apresentado-se números, como ocupação de hotéis, número de pessoas trabalhando direta e indiretamente nestas atividades, etc.

Na questão do rafting, devem aparecer mais dados sobre as condições ideais para a prática do esporte, e mostrar os períodos do ano onde existe maior atração de turistas, assim como as conseqüências quando a atividade está prejudicada for algum fator hidrológico. Isto serviria para projetar um cenário se o rafting deixar de ser um atrativo.

Como vemos, o primeiro assalto apenas começou.


Capivara descansa às margens do rio Cubatão do Sul

Para conhecer na íntegra o manifesto do
Movimento Rio Cubatão Vivo
Vale ler também o relato da
Audiência Pública no blog Eco Flora

Fotos da RPPN Rio das Lontras: Fernanda Kock / Fotos do rio Cubatão gentilmente cedidas: Ativa Rafting, Apuama Rafting e Sandra Eliane Michel
Colaborou: Antonio Carlos Beaumord -
Ph.D. em Ecologia e professor de Impactos Ambientais